Câmara destina dinheiro do Fundeb para a educação privada
Na noite da última quinta-feira (10), os deputados do chamado “centrão” e do bloco de apoio ao governo Bolsonaro aprovaram a regulamentação do novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) com alterações que permitem que o dinheiro público seja usado para financiar entidades privadas no Sistema S e filantrópicas.
As alterações aprovadas no projeto de lei 4372/2020 ameaçam as principais conquistas obtidas com a aprovação do novo Fundeb Permanente, que estabeleceu o aumento gradativo da contribuição da União dos atuais 10% para 23% em 2026. Se o retrocesso prevalecer, o dinheiro destinado à educação pública deve diminuir, mesmo com o aumento gradual do percentual investido, devido à pressão e à concorrência com o setor privado.
O interesse do governo Bolsonaro em transferir recursos do Fundeb para os empresários faz parte do projeto neoliberal de transformar direitos em mercadorias. Essa transformação radical no papel do estado é justamente o que propõe a Reforma Administrativa enviada ao Congresso em setembro.
Veja os principais retrocessos aprovados no projeto de lei 4372/2020, que regulamenta o novo Fundeb
- Permite que os recursos do Fundeb sejam usados para financiar a oferta de educação técnica e profissional em instituições privadas conveniadas ao poder público, como as do sistema S. Não há qualquer limitação para essas parcerias!
- O ministro da Economia, Paulo Guedes, também já deixou claro que quer utilizar recursos do Fundo para privatizar a educação infantil por meio de convênios ou voucher.
- Permite que instituições comunitárias, confessionais e filantrópicas abocanhem mais 30% do custo aluno do FUNDEB para ofertar atividades extracurriculares aos estudantes de escolas públicas. A privatização do contraturno é um ataque inédito no Brasil!
- Autoriza a privatização de 10% das vagas do ensino fundamental e médio, permitindo que o poder público use verbas do Fundeb para custear vagas em escolas religiosas (confessionais), comunitárias e filantrópicas mesmo quando houver vagas em instituições públicas.
- Emenda apresentada pelo Partido Novo incluiu trabalhadores terceirizados que atuam nas instituições conveniadas e todos os profissionais vinculados às secretarias de educação na subvinculação que prevê que 70% dos recursos do Fundeb sejam destinados à remuneração dos profissionais da educação. Essa inclusão – que pode abranger contadores, administradores e até mesmo militares – permite que o poder público some salários pagos a outros profissionais no cálculo do percentual, o que reduzirá os recursos destinados aos planos de carreira e às políticas de valorização dos profissionais da educação.
Texto-base aprovado na Câmara joga fora avanços e acelera entrega de recursos à iniciativa privada iniciada em outros governos
Os ataques apresentados pelo governo Bolsonaro na regulamentação do Fundeb são inconstitucionais. Atualmente, só há autorização para que os recursos do Fundo sejam repassados a instituições privadas de educação infantil, educação no campo e especial. Ainda assim, o artigo 213 da Constituição Federal determina que a atuação dessas entidades deve se restringir a “quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública na localidade da residência do educando, ficando o poder público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua rede na localidade”.
Se essa movimentação é entendida junto com a Reforma Administrativa, fica claro que o projeto do governo Bolsonaro é acabar com essas garantias constitucionais para que o estado deixe de ser o principal responsável pela prestação dos serviços públicos e se torne um subsidiário, uma espécie de coadjuvante, com a função de auxiliar os empresários da educação privada.
É um ataque sem precedentes que acelera as concessões e brechas abertas aos empresários da educação privada em governos anteriores. O Plano Nacional de Educação (PNE) aprovado em 2014, ainda no governo Dilma Rousseff (PT), já permitia que recursos destinados à iniciativa privada, como o Programa Universidade para Todos (ProUni) e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), fossem contabilizados como investimento em educação pública.
Concessões como essa abriram brechas para que os empresários do setor tentem abocanhar uma fatia ainda maior do financiamento público e passem a ter prioridade na oferta de serviços públicos. Nossa mobilização deve reforçar a cobrança histórica em defesa de que os recursos públicos sejam investidos apenas na educação pública!